segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013


O PODER DAS PLANTAS E ERVAS MEDICINAIS

As gerações antigas da Amazônia garantem que a vida saudável e a cura dos males podem ser encontradas na floresta. O tratamento da saúde pelas plantas medicinais é uma prática bem ancestral, usada desde tempos pré-históricos na medicina popular dos diversos povos, existindo um grande número de espécies em todo o mundo. Muitas delas, entretanto, são venenosas ou pelo menos levemente tóxicas, devendo ser usadas com cuidado e em doses muito pequenas para se obter o efeito desejado.

Diz-se planta medicinal aquela que contém substâncias bioativas com propriedades terapêuticas, profiláticas ou paliativas. Na medicina atual, a fitoterapia utiliza muitas espécies do reino vegetal e estuda suas propriedades nos laboratórios das empresas farmacêuticas, a fim de isolar as substâncias que lhes conferem qualidades medicinais (princípio ativo) para produzir novos fármacos. A indústria cosmética também procura na flora elementos com propriedades regeneradoras para o fabrico de produtos utilizados na limpeza, conservação ou maquilagem da pele.

Há também aqueles que acreditam nos poderes sobrenaturais dos vegetais, ou valores a eles agregados por alguma divindade, sendo certas doenças originadas de distúrbios causados por entidades místicas, que encontram remédios na puçangaria (pajelança amazônica), que também faz uso de plantas, sementes e raízes silvestres. A puçanga é uma medicação mágica receitada pelos pajés, após consulta aos espíritos com quem trabalham, para curar doenças ou afastar malefícios. A diferença entre os dois casos é que um tem elementos teológicos agregados e outro é puramente medicinal, mas ambos frutos do conhecimento empírico das populações tradicionais, parte dele já assimilado pela ciência médica.

O interesse pelas ervas e plantas da Amazônia com aplicação nas áreas de saúde e cosméticas tem, aliás, crescido a cada dia, pois sua exploração comercial torna-se cada vez mais promissora, inclusive apresentando perspectivas de viabilidade econômica para a região amazônica. Quem afirma isso é o pesquisador Juan Revilla Cárdenas, doutor em Ciências Biológicas, chefe da área de Botânica Econômica do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Ele enfatiza que o segmento tem tudo para crescer e se tornar uma atividade econômica bem lucrativa para a região, desde que se profissionalize o setor.

Mas é no uso tradicional que as qualidades medicinais do reino vegetal amazônico se destacam, conquistando recentemente o campo científico, como objeto de estudo de importantes entidades brasileiras, a exemplo do Instituto Butantã, que levou a São Paulo um afrodescendente do quilombo do Pacoval, em Alenquer, a fim de que ele revelasse em vão o segredo do poderoso antiofídico que tem salvado vidas neste município paraense. Os pretos do Pacoval, como são conhecidos os membros da família Assis, têm realizado verdadeiros milagres com as garrafadas e soros que preparam e que aprenderam de seus ancestrais escravos, inclusive esse cobiçado soro antiofídico.  

A puçangaria ou a pajelança é um traço comum em praticamente todos os municípios da Amazônia. Não há cidade ou povoado que não tenha um curandeiro ou benzedeira capaz de amenizar os males da população mais carente. Até mesmo os mais abastados da sorte valem-se dos dons dessas pessoas místicas, quando não encontram guarida na medicina científica, procurando solução nos remédios da floresta. O próprio Inpa reconhece o potencial das plantas medicinais da Amazônia, produzindo uma lista de cerca de 300 vegetais nativos e introduzidos, pesquisados e catalogados por seu valor para as áreas medicinal, fitoterápica, aromática e de cosméticos, dentre as 25 mil espécies mundialmente conhecidas.

A sacaca, andiroba, unha-de-gato, alfavaca, muirapuama, catuaba, cubiu, camomila, sálvia, aloé-vera, verbena, altéia, prímula, angélica, alfazema, patchuli, jamborandi, babosa, menta, alecrim, jojoba, amor-crescido, bonjuá, calêndula, arnica e hamamelis são algumas das espécies mais utilizadas pela medicina popular amazônica. Há vários outros grupos de vegetais utilizados além dos fitoterápicos e cosméticos, que são os de repelentes, inseticidas, corantes, fibras e complementos alimentares.

A medicina da floresta, que está conquistando os cientistas do mundo inteiro, não é popular apenas para as comunidades amazônidas, cujas receitas são muitas vezes aprendidas com os índios e passadas de pai para filho há gerações. Nas feiras e mercados das cidades, como no Ver-o-Peso, em Belém, e Adolfo Lisboa, em Manaus, existem alas onde as garrafadas, raízes, cascas e folhas secas das plantas da Amazônia são vendidas em separado, misturadas ou em pó. 

Entre os inumeráveis mestres das ervas, um desses que fez reinado em determinadas localidades da Amazônia, está o macapaense Raimundo dos Santos Souza, o popular Sacaca. Como caboclo, desde criança, aprendeu na comunidade a tratar-se com as ervas tradicionais. Ainda menino, teve com o pai os primeiros contatos com as plantas, raízes e cipós, conhecimento ampliado com os pesquisadores estrangeiros que passavam temporadas no Amapá, estudando os recursos naturais da região.

Menino inteligente, curioso e dotado de uma memória invejável, teve seus conhecimentos aumentados sobre as plantas com o decorrer do tempo. Negro, morador do Laguinho, um dos mais tradicionais bairros de Macapá, pelas suas raízes africanas, construiu fama em toda a cidade com a alcunha que o consagrou, Sacaca, e pelos bons resultados alcançados com suas ervas e garrafadas milagrosas. Procurado pela população macapaense, Sacaca tornou-se a esperança de cura de diversas doenças até que veio a falecer em 1999.

A morte de Sacaca foi motivo de luto para toda a população amapaense. Todos o conheciam pela fama de suas milagrosas ervas ou tinham ouvido falar dele. Seu nome tornou-se lenda e se encontra registrado no Museu Sacaca, que guarda sua memória e o acervo de suas experiências acumuladas, que não se perdeu. Sua lista de plantas que curam é enorme e foi usada não só por ele, como por uma grande quantidade de pessoas de origem cabocla e indígena.

 

Conheça o receituário de algumas plantas mais populares:

Alfavaca (banhos e combate ao resfriado);

Alho (pressão alta, resfriado e gases);

Amor-crescido (tratamento de fígado e queda de cabelo);

Andiroba (massagens em lesões, combate inflamações e males na garganta);

Arruda (dor-de-cabeça e mau-olhado);

Barbatimão (estômago e inflamação uterina);

Boldo (derrame, fígado e estômago);

Cana-ficha (rins e infecção urinária);

Capim-marinho (calmante e pressão alta);

Catuaba (reumatismo e impotência sexual);

Cheiro-da-mulata (derrame e infarto no miocárdio);

Comida-de-jabuti (pressão alta);

Erva-doce (fígado);

Erva-cidreira (pressão alta e calmante);
Hortelã (gripe, dor-de-cabeça e mal-estar);
Hortelãzinho (cólica infantil);
Manjericão (banhos e combate ao resfriado);
Parirí (anemia);
Pata-de-vaca (diabetes);
Pião-branco (combate a asma e cicatrizante);
Pirarucu (anti-inflamatório e vesícula);
Pracaxí (anti-inflamatório);
Quebra-pedra (pedra nos rins);
Sacaca (anticoncepcional, diurético e anti-diabetes);
Sucuúba (anti-inflamatório uterino e gastrite);
Trevo-roxo (dor de ouvido).

Nenhum comentário:

Postar um comentário